Uma pesquisa da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP está investigando como os educadores da rede pública de ensino representam o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e as implicações dessas significações nos processos de mediação e prevenção da violência nas escolas.
Os primeiros resultados indicam que parte dos professores compreende o estatuto como “excessivamente liberal”, “facilitador da conduta desregrada e indisciplinada” do aluno em sala de aula, “impedindo a tomada de medidas punitivas e disciplinares”. Outros acreditam que o estatuto é “adequado e até avançado em relação à prevenção da violência contra crianças e adolescentes, o problema seria ele ser posto em prática”.
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Essas percepções e opiniões paradoxais podem estar ligadas ao desconhecimento do ECA, segundo Daniel Massayuki, doutorando e autor do estudo, realizado com orientação do professor da FFCLRP, Sérgio Kodato. “Observa-se que o conhecimento sobre o estatuto é um pouco limitado e estereotipado, pois os discursos dos educadores representam o ECA como facilitador da indisciplina, mas ao mesmo tempo indicam que se avançou na conquista de direitos de crianças e adolescentes, desde que melhor executado.”
O professor Kodato destaca que “os educadores, acuados com a hostilidade dos alunos e seus familiares, reclamam que as medidas e recomendações do ECA sobre a contenção da violência não são colocadas em prática na escola, permanecendo no plano teórico e alimentando o caos”. Com isso, prevalece o clima de desacato à figura de autoridade, a falta de limites, sendo que os direitos de adolescentes que querem aulas e aprendizagem ficam prejudicados pelos que estão excluídos do processo pedagógico e adotam a conduta agressiva e transgressiva como uma forma de fornecer sentido a permanência cotidiana na escola.
“Os professores têm consciência da necessidade de detectar, cuidar e notificar ao Conselho Tutelar, os casos de alunos violentados e maltratados, em suas famílias e comunidades de origem. Mas, muitas vezes, preferem se omitir, em função de medo, do temor de vingança por parte dos denunciados e porque os encarregados de coibir a violência não estão conseguindo efetivar a averiguação das denúncias e culpabilização dos responsáveis”, afirma Kodato.
Segundo os pesquisadores, a forma como os educadores representam o estatuto influencia nas relações pedagógicas e desencadeia problemas que refletem negativamente no trabalho de todos na escola. “No caso do professor que desconhece o Estatuto da Criança e do Adolescente e está na sala de aula, ao presenciar relações conflituosas e brigas promovidas pelos estudantes indisciplinados, poderá representar essa violência como delituosa, se eximindo de mediar o conflito e encaminhando para a hierarquia superior ou mesmo à Ronda Escolar.
Instrumento de apoio
O professor Kodato destaca que os educadores poderiam assimilar o ECA como um instrumento de apoio ao desenvolvimento de estratégias e práticas para solucionar os problemas de violência na escolas, “no entanto esse processo está paralisado, atualmente, muitas instituições e agentes educacionais sentem-se intimidados e impotentes frente a situação de descalabro e agressão direta ou simbólica a figura do professor”.
A coleta de dados da pesquisa está sendo realizada com 20 educadores (professores, coordenadores, auxiliares de ensino e outros) de instituições do ensino fundamental II e médio da região de Barretos, no interior de São Paulo.
De acordo com os pesquisadores, o estudo utiliza a “Teoria das Representações Sociais” com referencial metodológico. “As representações são produzidas e circulam nas comunicações entre as pessoas, revelam singularidades delas no espaço político e institucional. Por exemplo, ao processo de socialização, resultado da interação entre as pessoas e o grupo de pertença, contribui para a elaboração de representações e significados a respeito de si, da sociedade, dos outros e do mundo”, afirma Kodato.
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