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Os falsos vilões e a redução da maioridade penal



O assassinato de um jovem universitário em São Paulo reavivou a animosidade de uma parte da opinião pública contra os menores de 18 anos, que - como se afirma - são protegidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - lei federal nº 8.069/1990). Em busca de uma bandeira de apelo popular para as eleições de 2014 - a defesa da Petrobras, como se previa, deu em nada -, o PSDB já anunciou que apresentará projeto no Congresso, para endurecer o tratamento previsto no ECA aos adolescentes infratores.

A redução da maioridade penal de 18 para 16 anos é uma resposta emocional baseada no falso pressuposto de que o grande problema da segurança pública no Brasil é o adolescente marginalizado. A imprensa tem grande parcela de culpa na construção dessa premissa, pois é ela que filtra, dentre milhares de ocorrências policiais, aquelas que chegarão ao conhecimento do público.

Estupros, assassinatos e latrocínios (roubos seguidos de morte) perpetrados por adultos se tornaram de tal forma banais que, salvo circunstâncias muito diferenciadas - como quando a vítima é alguém influente e conhecido -, não interessam como notícia. Já os crimes violentos praticados por menores geralmente são noticiados com destaque, gerando na opinião pública uma percepção, inclusive de volume, que não condiz com a realidade.

Não há sequer uma estatística confiável sobre a participação de menores de 18 anos em crimes violentos. A única estatística oficial de que se tem notícia foi divulgada há dez anos pela Coordenadoria de Análise e Planejamento da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, e indicava que apenas 1% dos homicídios eram cometidos por menores de 18. É possível que esse percentual tenha crescido nos últimos anos, principalmente devido ao emprego cada vez maior de adolescentes no tráfico de drogas. Mas, concretamente, o que se sabe é que, em todas as unidades da Fundação Casa, os adolescentes que cometeram homicídios e latrocínios representam 1,5% do total de internos - eles somam hoje 134 adolescentes, em um universo de 42,2 milhões de habitantes do Estado.

Atribui-se ao ECA uma suposta sensação de impunidade, que estaria levando os jovens infratores a matar com mais facilidade, já que, em tese, não precisariam encarar as consequências do que fazem. No entanto, o próprio governo do Estado comemora a queda do índice de assassinatos, que despencou 72% entre 1999 e 2011, passando de 35,2 por 100 mil para 10 por 100 mil. A redução dos homicídios coincide com a implementação gradual do ECA, e é algo que os detratores do Estatuto precisam questionar mais seriamente, antes de defender que a sociedade desista de recuperar seus jovens dois anos antes, atirando-os aos leões do sistema prisional já a partir dos 16.

Se a idade mínima para imputação penal fosse reduzida hoje, no Brasil, haveria diversos efeitos imediatos - mas, talvez, não o efeito pretendido. O índice de recuperação do jovem infrator seria menor, pois a Fundação Casa reeduca mais que os presídios; o tráfico passaria a empregar meninos ainda mais jovens para fornecer drogas à sociedade; garotos de 15 e 16 anos ricos seriam beneficiados com habeas corpus, enquanto os pobres seriam presos - e, muito provavelmente, o número de crimes hediondos não diminuiria de maneira significativa, até porque o sistema prisional está aí há muito tempo e não impede os maiores de 18 de cometerem toda a sorte de atrocidades.

É fácil para os políticos e apresentadores de programas populares de TV defender a redução da maioridade penal, pois essa é uma ideia que dá votos e audiência. Mais difícil é o Estado proteger a infância e a juventude, oferecendo-lhes condições dignas de subsistência e boas oportunidades. Hoje, a sociedade só presta atenção no menor de 18 quando ele empunha uma arma. É isso o que precisa mudar.

Fonte: http://www.cruzeirodosul.inf.br/acessarmateria.jsf?id=466623

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