Processos de abandono afetivo contra os pais começam a chegar à Justiça.
Bernardo Boldrini, 11, procurou juiz para trocar de família antes de morrer.
No dicionário, negligência quer dizer desleixo, descuido, desatenção, menosprezo, preguiça, indolência. Mas nem o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nem o Código Penal tipificam a negligência familiar.
Segundo especialistas, a negligência pode ser entendida como uma situação de constante omissão para com a criança ou adolescente que coloque em risco seu desenvolvimento.
Direitos fundamentais
O que diz a Constituição Federal:
Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O que diz o ECA:
Art. 5º - Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
Ausência e abandono
Essa falha de cuidado pode abarcar diversos aspectos, desde a negligência em relação aos direitos básicos, como fornecer educação, alimentação, higiene e remédios, mas também pela falta de afeto.
Casos em que as crianças recebem toda a assistência material, mas não o apego maternal ou paternal, estão sendo tratados pelo Judiciário como “abandono afetivo”. São pais e mães que só trabalham e não estão presentes na vida dos filhos, cuidados apenas por babás ou parentes, por exemplo.
A negligência pode ocorrer também em residência de casais separados, em que um dos pais deixa de conviver com o filho. O ECA prevê multas para pais que descumprem os deveres do poder familiar, como sustento, guarda e educação dos filhos.
Por não haver uma conduta específica definida por lei, cada situação vem sendo analisada individualmente. Em decisão recente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) obrigou um pai a pagar à filha indenização de R$ 200 mil por abandono afetivo.
"Amor não pode ser cobrado, mas afeto compreende também os deveres dos pais com os filhos. [...] A proteção integral à criança exige afeto, mesmo que pragmático, e impõe o dever de cuidar", entendeu o ministro Marco Buzzi.
Crime
Já se a violação atinge um patamar mais grave, pode ser enquadrada pelo Código Penal como abandono de incapaz ou como maus-tratos.
O que diz o Código Penal:
- Não há crime específico de negligência familiar ou abandono afetivo. Decisões sobre danos morais ocorrem na área cível.
Abandono de incapaz
Se dá quando o menor é deixado sem cuidados. Uma única vez é suficiente. Exemplo: criança deixada em local ermo, sem proteção ou vigília.
Se dá quando o menor é deixado sem cuidados. Uma única vez é suficiente. Exemplo: criança deixada em local ermo, sem proteção ou vigília.
Art. 133 - Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono. Pena: detenção, de 6 meses a 3 anos.
Maus-tratos
Há uma exposição de perigo à vida ou saúde. Exemplo: criança deixada dentro de um carro fechado, sob sol forte, correndo risco de morte.
Há uma exposição de perigo à vida ou saúde. Exemplo: criança deixada dentro de um carro fechado, sob sol forte, correndo risco de morte.
Art. 136 - Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina. Pena - detenção, de 2 meses a 1 ano, ou multa.
Prevenção e omissão
O ECA diz ainda que é dever de todos prevenir qualquer tipo de violação aos direitos da criança e adolescente, sendo obrigatório fazer a denúncia, sob risco de pena para omissão.
Art. 70 - É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente.
Quem deixa de denunciar uma violação contra crianças e adolescentes, tendo conhecimento, pode responder criminalmente:
Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível, à criança abandonada ou extraviada (...); ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública. Pena: detenção, de 1 a 6 meses, ou multa.
Fonte: http://g1.globo.com/brasil/noticia/2014/04/entenda-o-que-e-negligencia-familiar.html
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